quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Mais municípios, menos verba


Ipea prevê a criação de 363 cidades e mudanças na divisão do FPM caso o Congresso derrube o veto à lei que regulamenta o assunto.


O Congresso Nacional se prepara para analisar, daqui a 11 dias, o veto da presidente Dilma Rousseff ao projeto que regulamenta a criação de municípios no Brasil. Ontem, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) acendeu um sinal vermelho para a proposta. Os pesquisadores avaliam que o número de municípios que podem ser criados, se a lei for mantida, é muito maior do que estimam os parlamentares. Pelo menos 363 localidades poderiam se emancipar amparadas pela nova lei. Com esse cenário, o Ipea diz que quase R$ 1 bilhão mudariam de mãos com a nova distribuição do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) — principal fonte de recursos da maioria das cidades brasileiras.
Ao elaborar o parecer sobre a proposta, o relator, senador Valdir Raupp (PMDB-RO), usou a estimativa elaborada pela União Brasileira em Defesa da Criação de Novos Municípios (UBDCNM) de que 188 poderiam ser criados com as novas regras. O Ipea, no entanto, avalia que seriam quase o dobro: pelo menos 363. Um número que pode ser muito maior. Isso porque o instituto trabalhou com informações fornecidas por 19 assembleias legislativas, analisando projetos em tramitação para criação de municípios. Como ficaram de fora sete unidades da Federação, os pesquisadores dizem que há ainda mais candidatos à emancipação.

A criação de municípios gera uma nova distribuição do FPM. Para os pesquisadores do Ipea, nada garante que isso beneficie as localidades mais pobres. “O sistema de transferência de recursos faz com que municípios muito pequenos sejam beneficiados do ponto de vista fiscal, recebendo mais do FPM. Mas esse recurso a mais vem em detrimento dos municípios existentes”, diz o coordenador de Estudos em Desenvolvimento Federativo do Ipea, Leonardo Monasterio, um dos responsáveis pela nota técnica do Ipea.

Monasterio avalia que, antes de se discutir a emancipação, os parlamentares deveriam se preocupar em discutir o remanejamento do FPM. “Hoje, os municípios pequenos são beneficiados. Se você corrige as distorções dessa distribuição, você consegue ver quais movimentos emancipalistas são movidos por motivos razoáveis, como a população estar desamparada, e não fiscais”, diz.
Para Valdir Raupp, é necessário reavaliar a distribuição do FPM, mas populações desamparadas não podem esperar. “Faz 17 anos que não se cria municípios. Essas ‘cidades’ vão ficar isoladas por mais 30? São pessoas que precisam ser mais assistidas. Todos os municípios que se emanciparam no passado melhoraram seus indicadores”, defende.

Os líderes partidários ainda não discutiram com as respectivas bancadas como será encaminhada a votação do veto pelo Congresso, marcada para o dia 17, mas o tema promete polêmica, já que a proposta foi aprovada pela ampla maioria dos parlamentares tanto na Câmara quanto no Senado.
O vice-presidente UBDCNM, José Nunes, contesta a avaliação dos pesquisadores do Ipea de que a maior parte é movida por motivos fiscais. “Eles estão fazendo pesquisa com base em números, dentro de escritórios. Essas pessoas (que moram em localidades que pleiteiam a emancipação) estão morrendo. Precisam logo se emancipar. Gostaria que essas pessoas visitassem esses bairros que querem se tornar municípios. Há casos em que estão a mais de 1,1 mil quilômetros da sede da cidade, sem acesso a esgoto e outros serviços.”

Nunes argumenta ainda que o projeto não é completamente favorável aos emancipalistas. “Há a previsão de plebiscito para a separação. Para conseguirmos virar município, precisaríamos do apoio de 50% de toda a população da cidade mais um voto. Isso é briga de Davi contra Golias. Só aceitamos esse termo porque é melhor ter regra do que não ter nada”, critica. Há outras restrições previstas na proposta, como limites de população mínimos para a emancipação, variando de acordo com a região do país.

O que diz a lei

O Fundo de Participação dos Municípios (FPM) é formado por uma parcela da arrecadação de impostos da União, que é repassado a estados, Distrito Federal e municípios brasileiros. A distribuição é feita de acordo com o número de habitantes — o cálculo é feito com base em um coeficiente de 0,6 a 4, aplicado a municípios com população entre 10,1 mil e 156 mil moradores. O fatiamento é criticado porque, para cidades com mais de 156 mil habitantes, o coeficiente permanece fixo em 4. Há, no Congresso, projetos que estabelecem novas maneiras de dividir o FPM, levando em conta, por exemplo, o índice de desenvolvimento social de cada município. Mas, como a discussão envolve interesses conflitantes, nunca houve avanço.

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