Em 18 de maio de 1973, Araceli Cabrera Crespo, 8 anos, foi
raptada, drogada, estuprada e brutalmente morta. O crimeaconteceu no Espírito
Santo. Exatos 45 anos se passaram, sem que ninguém fosse punido. A data virou
símbolo de luta contra o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes
em todo o País. Mas, quase meio século depois, as violações persistem, ainda
invisibilizadas. A violência contra meninos e meninas se esconde nas casas, nas
ruas e até mesmo nas estradas. É o que aponta um levantamento realizado entre
2017 e 2018 pelaPolícia Rodoviária Federal (PRF), em parceria com o instituto
Childhood Brasil. Nas rodovias federais brasileiras, foram identificados 2.487
pontos vulneráveis à exploração sexual de crianças e adolescentes. 45 estão localizados
em Pernambuco.
A quantidade de pontos vulneráveis no Estado aumentou 26%
desde o último estudo Mapear, realizado em 2013 e 2014. O número é superior ao
aumento de 21% no País, mas não chega a colocar Pernambuco no ranking dos
Estados mais propícios à exploração sexual em rodovias. Para a presidente da
comissão de direitos humanos da PRF em Pernambuco, Luciana Lima, o aumento não
é necessariamente ruim. “Não quer dizer que a violência aumentou, mas que
conseguimos verificar outros pontos vulneráveis nas nossas rodovias”,
argumenta.
De acordo com o mapeamento, as vítimas são, em 48% dos casos,
meninas. 36% são meninos e 16% são transgêneros. Os locais mais vulneráveis são
postos de combustíveis, bares, casas de show, pontos de alimentação e de
hospedagem. “São lugares onde há venda de bebidas alcoólicas e grande parada ou
concentração de veículos. Além disso, também estão associados ao consumo de
drogas”, explica Luciana Lima. Para que um ponto seja considerado vulnerável
não é necessário que haja flagrante de exploração sexual. Cada característica
(escuro, com grande circulação de pessoas, propício ao tráfico de drogas) conta
“pontos” que, somados, indicam se o local é crítico, de alto risco, de médio
risco ou de baixo risco. No Brasil, são 489 pontos críticos. Em Pernambuco,
apenas 10.
Na última edição do Mapear, a utilização de um aplicativo
otimizou o trabalho. “Antes, os policiais preenchiam um formulário a mão e,
posteriormente, transferiam as informações para uma plataforma online. Dessa
vez, eles puderam utilizar o aplicativo, que realiza automaticamente o
somatório e indica quais os pontos mais vulneráveis”, explica Eva Dengler,
gerente de programas e relações empresariais da Childhood Brasil. “Não temos
efetivo para cobrir todas as estradas brasileiras, por isso saber quais os
pontos mais críticos nos ajuda a atuar de maneira preventiva”, completa.
MULTIFATORIAL
Para ela, a exploração sexual é consequência de uma série de
fatores. “Quando traçamos comparativos entre os locais de maior vulnerabilidade
e dados do IBGE, descobrimos que são municípios de baixo Índice de
Desenvolvimento Humano e com muita desigualdade social. Mas a pobreza não é o
único indicativo. Em muitos os casos, a criança foi abusada em casa e, para não
continuar vivendo nesse ambiente, resolve se envolver nisso fora de casa, até
como maneira de sobrevivência. Muitos se prostituem também para comprar
drogas.”
Dengler explica que há dois caminhos que levam os jovens até
a prostituição: quando a própria família obriga e quando eles são aliciados.
“As redes criminosas não se limitam à exploração sexual. Os menores são usados
para vender drogas ou facilitar roubos. Também acabam sendo vítimas de tráfico
de pessoas. São vários crimes relacionados.”
Em 2012, Pernambuco se tornou o primeiro Estado a utilizar a
metodologia também nas rodovias estaduais, durante um projeto piloto. A
iniciativa deve ser retomada nos próximos anos, segundo Eva Dengler.
0 comentários:
Postar um comentário