Oitenta hectares dedicados à plantação de mandioca. Esse é o
número exato que garante o sustento da família do agricultor Vilmar da Silva
Carvalho, 58 anos. “Desde pequeno trabalho na roça. Já tentei sair daqui para
achar uma outra forma de ganhar a vida, mas Deus me disse que o meu ganha pão é
esse”, afirma contente meses depois de ter recebido a notícia de que começaria
a vender diretamente para uma indústria multinacional e deixar de lado a
agricultura de subsistência. Vilmar e mais outras cinco famílias foram
selecionadas pela Ambev para fornecer a matéria-prima para a produção da
cerveja Nossa, que é distribuída em todo o território pernambucano desde o meio
do ano com um preço final sugerido de R$ 3 em uma garrafa de 600 ml.
Produzida na fábrica da companhia em Itapissuma, a cerveja recebe
de Araripina o féculo proveniente da mandioca sertaneja, fundamental para a sua
produção. Toda a cadeia da bebida é desenvolvida no estado. E a Ambev lida
diretamente com os agricultores para obter a matéria-prima. “Eu plantava
mandioca em 50 ha, depois que comecei a vender para a cervejaria, minha
produção vem de 150 ha”, comenta contente o agricultor Silvano Coelho, que já
foi professor da rede municipal e deixou de lado a sala de aula para se dedicar
integralmente à produção da raiz.
O plantio dos agricultores na cidade que fica a cerca de 600
km de distância do Recife não é por acaso. “A ONG internacional TechoServe
mapeou a região onde poderíamos obter o elemento que precisávamos nas condições
ideais para os dois lados”, diz o engenheiro agrônomo e um dos responsáveis
pelo desenvolvimento dessa cadeia produtiva junto à Ambev, Vitor Pistoia.
Araripina é a maior potência do Nordeste na produção de mandioca. Inclusive, a
própria cidade já conta com a fábrica que transforma a raiz no produto que é comercializado
para a indústria, o féculo. Trata-se da Maxx Amidos do Brasil, fecularia que
estava pronta para começar a operar desde 2012, mas só em junho último, com o
início da importação para a fábrica da Ambev em Itapissuma, começou a
funcionar. Ou seja, cerca de 714 quilômetros separam a matéria-prima do produto
final – distância entre a cidade sertaneja e a fábrica da cervejaria em
Pernambuco. No entanto, nem toda a produção de féculo se destina para a
fabricação da cerveja. “A fécula pode ser usada pela indústria para outros
derivados, como polvilho azedo industrial, creme de confeiteiro, pasta de
dente, glicose, papelão e até plástico biodegradável”, lista o gerente de
produção da fábrica Márcio Silva.
A novidade das vendas para a cervejaria fez com que toda a
mão de obra na produção contasse com contribuição das famílias desses
agricultores. Vilmar é taxativo quando afirma que os filhos, genros e esposa
são os trabalhadores do período da safra e entressafra. “Minha esposa cuida da
nossa alimentação, meu filho dirige as máquinas, meus genros fazem o plantio e
assim seguimos”, lembra, sem revelar detalhes do valor cobrado em cada tonelada
de mandioca colhida. Mas estima-se que no período de entressafra, a venda de
100 kg da raiz fique em torno de R$ 350. Em tempo, a média de produção de
mandioca em todo o Sertão do Araripe fica em torno de 500 mil toneladas por
ano.
A proposta da Ambev de criar, produzir e comercializar um
produto para um mercado específico vem de longa data. Exemplo disso é a cerveja
Colorado e a Polar. Mas nenhuma dessas se restringe a comercialização única no
seu estado de produção, como é o caso da pernambucana Nossa.
Região do Araripe é favorável
A cidade de Araripina tem uma posição estratégica que leva o
destaque na produção da mandioca. É que as regiões onde existem as plantações
na localidade têm altitude elevada, o que favorece o plantio. “A Serra do
Araripe tem 800 metros acima do nível do mar e essa altitude é considerada a
melhor para o cultivo de quase 300 mil hectares. Já a Serra do Inácio tem cerca
de 21 mil hectares”, destaca o agricultor Silvano Coelho. Dessa forma, com a
união entre altitude elevada, que gera facilidade para ventos, certa umidade e,
por sua vez, propensão para receber as chuvas, a mandioca é favorecida nesse
chão. Até porque a planta não necessita de um intenso regadio para conseguir se
desenvolver. “O armazenamento de água que existe na planta é fundamental para a
mandioca se destacar na seca. É a planta do Sertão”, diz.
Dentro do infinito das plantações dos agricultores
araripinenses, destaca-se a distinção das duas variedades da raiz. “A mandioca
brava é destinada para a indústria para ser obtido o féculo e só a partir daí
ser comercializada para fins alimentícios”, comenta o engenheiro agrônomo, Vitor
Pistoia. Não é possível comer essa variedade da planta assim que colhida, pois
ela conta com ácidos que são tóxicos ao organismo humano e até o animal. Já a
segunda vertente, que é conhecida como mandioca mansa, é a mais popular. “É a
famosa macaxeira, que a gente pode cozinhar assim que colhe”, lembra.
O principal fim para a mandioca brava, era, até então,
destinado para a produção de farinha.”%u201CNós armazenávamos as sacas que eram
feitas nas nossas próprias casas de farinha e vendíamos umas e esperávamos o
preço ficar melhor para vender outras”, lembra Vilmar. O agricultor, por
arrendamento, planta em cerca de 400 ha para conseguir, hoje, dar conta da
demanda vinda da multinacional. “Vendo aproximadamente 150 toneladas de
mandioca para a Ambev”.
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