O atendimento psicológico online é uma realidade, há alguns
anos, no Brasil e no mundo. Atento a esse cenário, o Conselho Federal de
Psicologia (CFP) elaborou uma nova resolução com o objetivo de garantir que o
serviço seja passível de fiscalização e prestado dentro de padrões éticos. As
mudanças passaram a valer a partir dessa semana.
Com a nova resolução, cada profissional precisará se
cadastrar no site do CFP, preenchendo um formulário que pede dados pessoais e
profissionais, detalhes do serviço que será prestado, indicação das plataformas
que serão utilizadas, entre outras informações. Os cuidados que serão tomados
em relação ao sigilo do paciente também precisam ser descritos.
O atendimento online é vedado em algumas situações, como
quando o paciente estiver em situação de violência ou de violação de direitos.
Também não pode ser prestado a vítimas de desastres. Diante da vulnerabilidade
desses pacientes, o apoio psicológico deve ser presencial. Além disso, crianças
e adolescentes só podem ser atendidos por plataformas online se houver
concordância dos pais. Há outras situações em que o serviço é permitido apenas
de forma complementar, sendo obrigatório o contato presencial.
“É mais uma maneira de ajudar as pessoas. Mais uma maneira de
possibilitar, por exemplo, o atendimento de quem mora longe, quem mora no
interior, quem está viajando e quer continuar um atendimento, quem tem
dificuldade de locomoção. Há casos também em que a pessoa se sente
desconfortável em falar presencialmente, se sentindo mais a vontade no
computador”, avalia a conselheira Rosane Lorena Granzotto.
Ela lembra que a demanda por atendimento psicológico é cada
vez maior. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que cerca de 300 milhões
de pessoas em todo o mundo sofrem de depressão. Em agosto, reportagens da
Agência Brasil mostraram a preocupação das universidades com o aumento
significativo de casos de suicídio, depressão, ansiedade e outros quadros
relacionados à saúde mental que tem afetado a população jovem.
Aprovada em 11 de maio, a Resolução 11/2018 entrou em vigor
nesta semana após a conclusão do prazo estipulado de 180 dias. Segundo Rosane,
a iniciativa surgiu tanto a partir da demanda de parte da categoria, como
também da necessidade de se adequar à realidade. “Nós estávamos até um pouco
atrasados. Agora nos atualizamos. Nossa resolução é similar à de outros
países”, diz a conselheira, citando Canadá, Estados Unidos, Inglaterra,
Portugal e Espanha.
Discussão antiga
Rosana explica que o uso da tecnologia na profissão é uma
discussão que vem sendo feita desde a década de 1990 e a resolução que vigorava
até então, de 2012, já previa atendimentos online, mas com muitas restrições.
Eram permitidas orientações psicológicas de diversos tipos até o limite de 20
sessões por ano para cada paciente. A psicoterapia era vedada, exceto quando
realizadas em caráter experimental para fins de pesquisa. O psicólogo ou
psicóloga deveria ainda ter um site exclusivo para a oferta dos serviços
online, registrado em domínio nacional e cadastrado no CFP.
“De 2012 para cá, parece que não é tanto tempo. Mas com a
rapidez do desenvolvimento tecnológico, nós tivemos muitas mudanças. Nesse
período, surgiu o Whatsapp e outras plataformas. Também foi aumentando muito o
número de profissionais que estava realizando atendimento online e nós não
tínhamos como controlar que tipo de serviço estava sendo oferecido”, diz
Rosane.
A partir de agora, não haverá mais limite para o número de
sessões por ano e a psicoterapia está liberada. A exigência do site também não
existe mais. “Será responsabilidade do psicólogo avaliar as questões técnicas e
metodológicas. Caberá a ele avaliar se aquilo que o paciente está buscando é
compatível com esse tipo de atendimento. Porque há situações que demandam o
atendimento presencial”, afirma a conselheira.
Desde o último sábado (10), o profissional já pode realizar o
cadastro no site do Conselho Federal de Psicologia. Segundo Rosane, apenas nos
três primeiros dias, foram preenchidos mais de mil formulários. Ela explica
que, se o profissional cometer alguma falha ética e for denunciado, ele poderá
ser localizado e processado. O CFP também pode aplicar sanções e até cassar o
registro profissional. O cadastro é público e fica disponível para a consulta
da população. “Sabemos que podem ocorrer violações éticas, mas que também
acontecem nas consultas presenciais”, avalia a conselheira. Ela afirma que a
resolução busca dar transparência ao serviço, facilitando assim a apuração de
desvios de conduta e as denúncias.
A psicóloga Laura Quadros, chefe do Serviço de Psicologia
Aplicada da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), reconhece que
alguns colegas não são favoráveis ao atendimento online. Em sua visão, porém,
trata-se um algo inevitável e desafiante. “Já vivemos na era virtual e temos
uma geração que está muito atravessada pela tecnologia. Portanto, um serviço
como esse pode ser até um facilitador. Há pessoas que vão se sentir melhor
usando essas ferramentas. Isso nos faz rever o modelo tradicional. Quando
trabalhamos com pessoas é importante estar aberto ao novo”, avalia. Segundo
ela, a resolução abrange os cuidados necessários em relação às situações mais
agudas e aos menores de idade.
Experiência individual
Criado há três anos, o Fala Freud é hoje a maior plataforma
em operação que oferece atendimento psicológico online, no país. De acordo com
o empresário Yuri Faber, um dos fundadores, a ideia surgiu de uma experiência
individual. “Eu já estava morando nos Estados Unidos, prestes a me casar, mas
com alguns atritos de relacionamento que são comuns na vida de casal. E aí eu
procurei minha antiga psicóloga no Brasil e começamos a nos falar por Whatsapp.
Comecei a perceber que muitas pessoas poderiam ter interesse em falar com um
psicólogo por uma plataforma online”, conta.
De acordo com Yuri, as normas no Brasil estavam ultrapassadas
e colocavam limites que já não existem há anos nos Estados Unidos e na Europa.
Segundo ele, houve atritos com o CFP até que o conselho sinalizou enfim a
elaboração de uma nova resolução e pediu sugestões ao Fala Freud. Yuri Faber
aprovou as mudanças.
“Tem muita gente que não quer ir a um consultório, que mora
fora do país, que mudou de cidade e não quer perder o vínculo com seu
psicólogo. A resolução anterior limitava isso. Uma pessoa que mora no exterior
só poderia fazer 20 sessões ao ano, o que corresponde a quatro ou cinco meses.
Depois teria que abandonar a terapia”, explica.
Uma das usuárias do Fala Freud é Beatriz Tonon, de 23 anos.
Ela sentiu necessidade de recorrer à ajuda profissional depois que se mudou a
trabalho de Campinas para São Paulo. São dois anos na capital paulista. Há seis
meses, ela recorreu à plataforma e aprovou o resultado. “Desde que vim para cá,
minha vida mudou completamente. Meu dia a dia é muito corrido, o ritmo é muito
frenético. Eu tenho muita ansiedade. Fico muito preocupada com o que vai
acontecer mais à frente”, conta.
Tempo e dinheiro
Beatriz revela que a escolha pelo Fala Freud se deu com base
em dois fatores: tempo e dinheiro. Ela chegou a pesquisar valores do
atendimento presencial e achou o serviço online mais barato. Ao mesmo tempo,
considerou que não teria tempo para o deslocamento até um consultório.
Ela conta que respondeu um questionário apresentando suas
necessidades e escolheu uma psicóloga a partir de uma lista de profissionais
apresentada pela plataforma, que trazia informações sobre cada um deles.
Beatriz diz ter acesso à profissional diariamente e que ela é bastante
atenciosa. Os contatos se dão por mensagens de texto e áudios e, uma vez por
semana, há uma sessão em vídeo. “Eu consigo contar para ela quando acontece
alguma coisa no calor do momento. E ela consegue me ajudar. Não preciso esperar
até o dia da próxima consulta”.
Segundo o Fala Freud, desde sua fundação, já passaram pela
plataforma mais de 650 mil pessoas. Os psicólogos estão disponíveis 24 horas
dia. Alguns moram no exterior. A plataforma afirma que só trabalha com
profissionais que têm no mínimo 10 anos de experiência. Também garante que
observam a legislação brasileira sobre tráfego de informações e que as mensagens,
como no Whatsapp, são criptografadas de ponta a ponta, sendo acessíveis apenas
ao psicólogo e ao paciente. A próxima novidade que será anunciada é o
atendimento através de planos de saúde. “Em breve, vamos divulgar quais deles
já toparam”, diz Yuri
Agência Brasil/EBC
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