O ex-secretário do Meio Ambiente do governo paulista de
Geraldo Alckmin, Ricardo Salles, que vai comandar o Ministério do Meio Ambiente
a partir de janeiro, conforme anunciou ontem (9) o presidente eleito, Jair
Bolsonaro, responde a ação civil por improbidade administrativa, acusado de
alterar ilegalmente o plano de manejo de uma área de proteção ambiental para
supostamente favorecer interesses empresariais.
No período em que esteve à frente da Secretaria do Estado de
São Paulo – de julho de 2016 a agosto de 2017 – foi alvo de ação do Ministério
Público (MP-SP), acusado de irregularidades durante a elaboração do Plano de
Manejo da Área de Proteção Ambiental (APA) da Várzea do Rio Tietê, em 2016. O
processo foi aceito pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) e está em
fase de sentença. Já o plano de manejo está suspenso por causa da ação, segundo
o promotor Silvio Marques.
“A minuta de decreto do plano de manejo e os mapas de
zoneamento da APA [Área de Proteção Ambiental] passaram a sofrer inúmeras
modificações, todas feitas na clandestinidade e que visavam a favorecer o setor
industrial, notadamente o minerário, entre outros, descaracterizando totalmente
a minuta de decreto e os mapas de zoneamento”, diz ação do MP.
Os mapas de zoneamento já haviam passado por análise e
votação na Comissão Temática de Biodiversidade, Florestas, Parques e Áreas
Protegidas (CTBio), órgão auxiliar do Conselho Estadual do Meio Ambiente
(Consema), que foi destinada pela legislação para esta atribuição.
Demandas apresentadas pela Federação das Indústrias do Estado
de São Paulo (Fiesp) e pela Federação da Agricultura do Estado de São Paulo
(Faesp), que já tinham sido debatidas pelos membros da CTBio e que foram
rechaçadas pela comissão, teriam sido contempladas no plano de manejo por meio
das mudanças realizadas por Salles.
O MP afirma que não havia qualquer justificativa para
alteração no plano de manejo e que elas foram feitas por determinação do
secretário Estadual do Meio Ambiente, Ricardo Salles.
Defesa
Em entrevista à Rede Globo, Salles apresentou sua defesa: “Em
certos lugares, onde diziam que era área de preservação, já tinha estação de
tratamento de esgoto, havia avenidas, conjuntos residenciais da CDHU. Quer
dizer, se nós deixássemos aquele plano de manejo ser aprovado daquela forma,
absolutamente desconectado da realidade, o prejuízo a todos, à sociedade, ao
desenvolvimento econômico e ao meio ambiente, seria enorme”.
O indicado comentou ainda, na entrevista, o andamento do
processo. “Sou réu, mas não há decisão contra mim. São todas favoráveis a mim.
Todas as testemunhas foram ouvidas, todas as provas produzidas e o processo
está concluso para sentença, pode ser sentenciado a qualquer momento. Todas as
testemunhas ouvidas, de funcionários do governo e fora, corroboraram a minha
posição”, afirma Salles.
Citada pelo MP, a Fiesp foi procurada pela reportagem da
Agência Brasil, e não se pronunciou até o momento. A Secretaria de Meio
Ambiente de São Paulo informou, em nota, que não vai se manifestar.
Ambientalistas
As polêmicas que envolvem o Ministério do Meio Ambiente
começaram logo após vitória de Bolsonaro nas eleições, quando chegou a ser
anunciada a fusão dos ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente. Depois de
reações negativas, o presidente eleito recuou da decisão.
No entanto, a escolha de Ricardo Salles para comandar a pasta
do Meio Ambiente gerou críticas de várias organizações que defendem direitos
ambientais.
A coalização de organizações da sociedade civil Observatório
do Clima avaliou assim a indicação: “Se por um lado contorna o desgaste que
poderia ter com a extinção formal da pasta, por outro garante que o MMA
[Ministério do Meio Ambiente] deixará de ser, pela primeira vez desde sua
criação, em 1992, uma estrutura independente na Esplanada. Seu ministro será um
ajudante de ordens da ministra da Agricultura”, acusa a entidade em nota.
O Greenpeace avalia que a nomeação de Salles ocorre no
momento em que a área ambiental recebe más notícias, quando o desmatamento da
Amazônia registrou o maior índice dos últimos dez anos e o país acaba de
retirar sua candidatura para sediar a COP-25. E também julga que irá favorecer
os setores ligados à agricultura. “A principal função do novo ministro será a
promoção de uma verdadeira agenda antiambiental, colocando em prática medidas
que vão resultar na explosão do desmatamento na Amazônia e na diminuição do
combate ao crime ambiental. O que já está ruim, pode piorar”, afirmou Márcio
Astrini, coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil.
A WWF, outra organização não governamental internacional,
comentou a nomeação, dizendo que esta é uma pasta estratégica para o Brasil. A
entidade destaca que a destruição ilegal das florestas na Amazônia e do Cerrado
diminuem a competitividade dos produtos brasileiros diante de um mercado global
que busca produtos livres de desmatamento, além de prejudicar o cumprimento dos
compromissos que o Brasil assumiu no Acordo de Paris, como a diminuição na
emissão de gases de efeito estufa.
“Desejamos que o Ministério do Meio Ambiente cumpra a missão
de balancear as questões ambientais nas outras pastas do governo, zelando assim
para que o Brasil tenha medidas necessárias para proteger de forma estratégica
o nosso imenso patrimônio natural. E que tenha capacidade de dialogar com os
diversos setores da sociedade, uma vez que o direito à um meio ambiente
saudável se aplica a todos, desta e das futuras gerações”, disse Mauricio
Voivodic, diretor executivo do WWF-Brasil.
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