O Supremo Tribunal Federal (STF) deve retomar na quarta-feira
(2) o julgamento sobre a restrição ao foro por prorrogativa de função,
conhecido como foro privilegiado, para deputados e senadores. Até o momento, há
maioria de oito votos a favor do entendimento de que os parlamentares só podem
responder a um processo na Corte se as infrações penais ocorreram em razão da
função e cometidas durante o mandato. Caso contrário, os processos deverão ser
remetidos para a primeira instância da Justiça.
O julgamento começou no dia 31 de maio de 2017 e foi
interrompido por dois pedidos de vista dos ministros Alexandre de Moraes e Dias
Toffoli, que será o próximo a votar. O relator, Luís Roberto Barroso, votou a
favor da restrição ao foro e foi acompanhado pelos ministros Marco Aurélio,
Rosa Weber, Cármen Lúcia, Edson Fachin, Luiz Fux e Celso de Mello. Faltam os votos de Toffoli,
Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski.
STF
Julgamento foi interrompido em novembro no STF - Antonio
Cruz/ABr
De acordo com o voto de Barroso, o foro por prerrogativa dos
deputados, previsto no Artigo 53 da Constituição, deve ser aplicado somente aos
crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções
desempenhadas. O voto do ministro também prevê que o processo continuará na Corte
se o parlamentar renunciar ou para assumir um cargo no governo após ser
intimado para apresentar alegações finais.
De acordo com professor da FGV Direito Rio Ivar Hartmann,
coordenador do projeto Supremo em Números, a restrição ao foro privilegiado pode
permitir que os julgamentos de questões penais que, obrigatoriamente, devem ser
julgados pelos colegiados da Corte, sejam mais céleres, diante da menor
quantidade de ações. Segundo o professor, devido ao acúmulo de processos, a
maioria das decisões do STF são tomadas individualmente pelos ministros.
"Na parte que decide colegiadamente há um gargalo muito
sério, nas turmas e no plenário,como essas ações de inquérito com foro que são
decididas colegiadamente, tirá-las afetaria positivamente o colegiado”, disse
Hartmann à Agência Brasil.
Gargalo
Conforme o estudo Supremo em Números, o tempo de tramitação
de uma ação penal em 2016 foi de 1.377 dias, tempo maior que o registrado em
2002, quando o processo era julgado em aproximadamente em 65 dias.
Entre 2012 e 2016, das 384 decisões tomadas em ações penais,
a declinação de competência, quando o parlamentar deixa o cargo e perde o foro
no STF, representou 60% dos despachos, enquanto as absolvições chegaram a 20%.
Condenações ficam em apenas 1%.
O promotor de Justiça e professor de Direito Penal do
Complexo de Ensino Renato Saraiva (CERS) Rogério Sanches Cunha explica que o
foro por prerrogativa de função foi criado para punir crimes funcionais, mas,
ao longo do tempo, deixou passou a ser um privilégio. “Nós banalizamos o foro.
Temos mais de 50 mil pessoas com foro por prerrogativa de função", disse o
professor.
Sobre as consequências da decisão da Corte, Sanches avalia
que as investigações que estão em andamento no STF e que devem seguir para a
primeira instância não serão iniciadas novamente e retomadas do ponto em que
foram suspensas. Para o professor, os processos devem sofrer algum atraso, mas
serão decididos bem mais rápido em relação aos que tramitam no STF. “Num
primeiro momento, vai gerar atraso para os casos em andamento, mas será muito
menor que o STF”, afirmou.
Lava Jato
Mesmo com a finalização do julgamento, a situação processual
dos deputados e senadores investigados na Operação Lava Jato pelo STF deve
ficar indefinida e as dúvidas serão solucionadas somente com a análise de cada
caso. Os ministros terão que decidir se parlamentares vão responder, na própria
Corte ou na primeira instância, às acusações por terem recebido recursos
ilegais de empreiteiras para financiar suas campanhas.
Na avaliação do professor Hartmann, existem argumentos
jurídicos relevantes a favor e contra a manutenção do foro para crimes
cometidos para financiar campanhas. "Interpretar o caso de crime
envolvendo financiamento de campanha é um caso onde eu consigo ver
argumentações para os dois lados. Há argumentos no sentido de que não é em
função [do mandato] ou até não é durante o mandato. Por outro lado, vejo
argumentos possíveis no sentido de que a pessoa está usando as prerrogativas
cargo para cometer esse crime", avalia.
O caso concreto que está sendo julgado pelo STF envolve a
restrição de foro do atual prefeito de Cabo Frio (RJ), Marcos da Rocha Mendes.
Ele chegou a ser empossado como suplente do deputado cassado Eduardo Cunha, mas
renunciou ao mandato parlamentar para assumir o cargo no município. O prefeito
respondia a uma ação penal no STF por suposta compra de votos, mas, em função
da posse no Executivo municipal, o processo foi remetido para a Justiça. Na última terça-feira (24), Mendes teve o
mandato cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Repórter da Agência Brasil
Brasília
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